Segurança Jurídica em Obras Rodoviárias: O TCU e a Revisão dos Critérios de Reequilíbrio do DNIT
Por: Nayron Russo, Carolina Abreu e Rebeca Lorentino estagiária supervisionada
A definição de critérios objetivos e juridicamente sólidos para o reequilíbrio contratual é um passo essencial para assegurar a continuidade de obras públicas e preservar a saúde financeira das contratadas. A experiência recente evidencia que oscilações abruptas nos preços de insumos estratégicos, como os materiais betuminosos, têm potencial de comprometer a execução contratual e gerar litígios prolongados. Por isso, o aprimoramento normativo deve equilibrar rigor técnico com viabilidade operacional, reforçando a previsibilidade e a isonomia nas contratações
públicas.
Nesse contexto, em decorrência direta do Acórdão n. 1.210/2024-Plenário, do Tribunal de Contas da União (TCU), o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) deu início à revisão de seus normativos internos sobre o reequilíbrio econômico-financeiro de contratos administrativos afetados por oscilações nos preços de materiais betuminosos.
Com o objetivo de atualizar e aperfeiçoar os critérios atualmente previstos na Resolução n. 13/2021, o DNIT promoveu, ao final de 2024, reunião técnica conduzida pela Coordenação de Obras de Construções Rodoviárias. Na ocasião, foi apresentada uma proposta preliminar de metodologia para análise dos pleitos de reequilíbrio, com foco na ampliação do diálogo com os agentes do setor e na coleta de contribuições para futura Instrução Normativa a ser submetida ao TCU.
Entre os principais pontos da minuta, destaca-se a sugestão de um novo parâmetro para aferição do impacto de insumos sobre a equação econômico-financeira dos contratos: o direito à recomposição seria reconhecido sempre que o preço de um insumo comprometesse mais de 60% do lucro líquido estimado.
Tal critério, no entanto, foi amplamente criticado pelas empresas participantes por se afastar da lógica contratual e dos requisitos legais, podendo inclusive impedir a recomposição contratual mesmo diante de aumentos substanciais nos custos — o que contraria a própria finalidade do reequilíbrio prevista na legislação. A realidade é que utilizar o lucro como parâmetro desvirtua o propósito do reequilíbrio, que é justamente restabelecer as condições efetivas da proposta contratual.
Nesse sentido, a parcela de risco indicada no BDI mostra-se um critério mais técnico e juridicamente consistente, pois reflete a capacidade do contratado de absorver variações ordinárias, servindo como limite para distinguir eventos excepcionais que, de fato, justificam a recomposição do equilíbrio contratual.
O DNIT acolheu as críticas e informou que as sugestões apresentadas serão analisadas.
O DNIT também se comprometeu a formalizar a solicitação de sugestões junto à ANEOR (Associação Nacional das Empresas de Obras Rodoviárias) e anunciou a realização de novas rodadas de discussão antes do envio do texto final ao TCU.
Paralelamente à construção da nova norma, o DNIT apresentou, em 10/07/2024, Pedido de Reexame ao TCU contra o Acórdão n. 1.210/2024, requerendo a ampliação do prazo inicialmente fixado (90 dias) para 180 dias, além de questionar exigências de comprovação como a apresentação de notas fiscais individualizadas por obra.
Segundo a autarquia, tais requisitos gerariam ônus desproporcional às contratadas e não garantiriam, por si só, a rastreabilidade da aplicação dos insumos. O TCU, por sua vez, reafirmou que as notas fiscais não são o único meio de prova aceitável, mas integram o conjunto de elementos necessários para verificar a efetiva ocorrência do desequilíbrio, recomendando ao DNIT a adoção de mecanismos de controle e rastreabilidade adequados.
O TCU concedeu efeito suspensivo às determinações até o julgamento definitivo do recurso. Em recente manifestação, a unidade técnica (AudRecursos) propôs a ampliação do prazo para 105 dias.
A equipe técnica reforçou que a Resolução n. 13/2021, embora aplicável às medições realizadas a partir de 2019, carece de critérios objetivos capazes de aferir a ocorrência de impacto financeiro significativo decorrente de aumentos de preços de insumos betuminosos, permitindo, na prática, reequilíbrios contratuais irregulares e
em afronta à teoria da imprevisão. Ademais, a AudRecursos reiterou o entendimento de que a comprovação da aquisição de materiais permanece como requisito para o reequilíbrio, desde que haja mecanismos adequados de controle e rastreabilidade, mesmo que as notas fiscais não mencionem diretamente a obra.
A discussão segue em curso e deve resultar em avanços relevantes na construção de um marco normativo mais claro, isonômico e alinhado à realidade da execução contratual, promovendo maior segurança jurídica na análise dos impactos financeiros decorrentes das oscilações de preços dos insumos betuminosos em obras públicas.